Mais do que a premiação em si, o maior apelo e atração do Prêmio da Música Brasileira sempre foram os números musicais em homenagem a um artista vivo ou morto. Na edição de 2018, o tributo foi feito a Luiz Melodia (1951 – 2017), cantor de voz aveludada que, a despeito de existirem gravações antológicas de Gal Costa e Elza Soares, geralmente se impunha como o melhor intérprete do próprio cancioneiro.

Essa obra pulsa no coração do Brasil, para citar verso de Magrelinha (1973), música reapresentada com vivacidade por Baby do Brasil em um dos melhores números musicais da festa-show realizada ontem, 15 de agosto de 2018, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro (RJ).

Com arranjos do pianista João Carlos Coutinho e com ênfase na produção autoral apresentada pelo compositor ao longo dos anos 1970, o roteiro musical do 29º Prêmio da Música Brasileira tinha como maior atração o encontro inédito de Maria Bethânia com o mano Caetano Veloso e os sobrinhos Moreno Veloso, Tom Veloso e Zeca Veloso. Em tons suaves, o número do clã foi bonito, mas sem o ardor exigido pela canção-blues Pérola negra (1971), lançada na voz de Gal Costa.

João Cavalcanti e Lenine cantam 'Congênito' no tributo a Luiz Melodia (Foto: Marcos Serra Lima / G1)
João Cavalcanti e Lenine cantam ‘Congênito’ no tributo a Luiz Melodia (Foto: Marcos Serra Lima / G1)

Em outro momento familiar, Lenine e João Cavalcanti – pai e filho – perseguiram o suingue de Congênito (1975). Na abertura, Fabiana Cozza deu peso a Ébano (1975), diluindo o suingue da música em número de tom político, espécie de resposta à polêmica racial enfrentada pela cantora ao ser convidada para interpretar Ivone Lara (1922 – 2018) em musical de teatro. Tanto que, após o número, Cozza enfatizou em tom falado: “meu nome é ébano”.

Cantora que normalmente dá vexame quando sai do próprio universo musical, Céu jamais comprometeu Salve linda canção sem esperança (1974). Mas não brilhou como o trio formado pelo bandolinista Hamilton de Holanda e o violonista Yamandu Costa com Pedro Luís – cantor que vem fazendo belo show dedicado à obra de Melodia – para cantar o choro Fadas (1978). O número foi o mais vibrante do roteiro musical.

Já o encontro da majestosa Áurea Martins com a emergente Xênia França em Juventude transviada (1976) se apoiou no contraste entre os timbres das cantoras. Em outro dueto, Zezé Motta reviveu Dores de amores (1978) com Sandra de Sá, cantora de voz sempre calorosa.

Por fim, Negro gato (Getúlio Côrtes, 1965) – música da qual Melodia se apropriou como intérprete a partir de 1980 – não chegou a arrepiar ao encerrar a cerimônia nas vozes do power trio formado por Iza, Lazzo Matumbi e Liniker. Sozinha, Alcione arrepiou muito mais ao entortar o samba Estácio, Holly Estácio (1972) como a excepcional cantora que sempre foi.

Contudo, entre altos e baixos, a homenagem póstuma a Luiz Melodia transcorreu bonita. Embora não tenham sido entregues em vida, as flores expuseram o perfume único da obra imortal do Negro gato.