Michael Poulsen, líder do grupo dinamarquês, fala da mistura de Elvis, Metallica e punk: 'Me orgulho'. Ele diz ser grande na Europa mas 'um nada no Brasil': 'Começando tudo de novo'.

O Volbeat é uma das raríssimas bandas de rock pesado e pegada mais tradicional do Lollapalooza 2018. No dia 23 de março, o quarteto dinamarquês mostra no festival do Autódromo de Interlagos, em São Paulo, sua mistura de Elvis Presley, Johnny Cash, Metallica, Slayer e Social Distortion – tudo com coberto com um alardeado tiquinho de anos 1950.

Ao tomar conhecimento de que é “defensor do peso” no evento, Michael Poulsen, guitarrista e cantor do Volbeat, dá risada e admite que desconhecia o fato. “Não é como se o Volbeat fosse uma banda de metal ou de heavy metal… Mas é algo do qual eu me orgulho. Escuto bastante heavy”, diz ele. “Se alguém quiser chamar o Volbeat de metal ou heavy metal, não tem problema.”

Aos 42 anos, Poulsen formou no início da década de 1990 a banda de death metal Dominus, que lançou quatro álbuns entre 1994 e 2000. Quando acabou, ele formou o Volbeat e assumiu um estilão mais clássico. Com esta, já está no sexto disco, o mais recente é de 2016.

Poulsen orgulha-se de já ter feitos shows ou turnês com Motorhead, Black Sabbath, Megadeth, Slayer, Social Distortion (Mike Ness é ídolo do entrevistado) e principalmente o Metallica, para quem já abriram uma tour em estádios.

Outro motivo de orgulho: o líder do Volbeat não tem perfis em redes sociais. Veja o porquê na entrevista deste simpático, bem-humorado e nostálgico artista que quase foi boxeador.

A banda dinamarquesa Volbeat, com o vocalista e guitarrista Michael Poulsen à frente (ex-boxeador e fã do esporte, ele usa camisa de Mike Tyson) (Foto: Divulgação)

A banda dinamarquesa Volbeat, com o vocalista e guitarrista Michael Poulsen à frente (ex-boxeador e fã do esporte, ele usa camisa de Mike Tyson) (Foto: Divulgação)

G1 – O Volbeat é uma das bandas de som mais pesado do Lollapalooza – uma das poucas. Como você se sente por representar esse estilo de som no festival?

Michael Poulsen – (risos) Ok, antes de mais nada, eu não sabia que éramos uma das bandas mais pesadas do Lollapalooza Brasil 2018. Não é como se o Volbeat fosse uma banda de metal ou de heavy metal… Mas é algo do qual eu me orgulho. Porque escuto bastante heavy metal e músicas assim.

E nós temos, de fato, um som distorcido, as guitarras. Talvez os nosso primeiros dois discos possam ser comparados ao metal, sabe? Só que algumas de nossas coisas mais recentes provavelmente são mais rock tradicional.

Se alguém quiser chamar o Volbeat de metal ou heavy metal, não tem problema, porque eu realmente curtia isso quando comecei. Lancei alguns discos de death metal com a minha banda antiga e ainda escuto muito metal.

Se nós pudermos, de alguma forma, representar o metal, vou ficar muito orgulhoso. Vamos fazer o nosso melhor para tocar algumas de nossas músicas mais pesadas.

G1 – O Volbeat tem influências assumidas de Elvis Presley, Johnny Cash, Metallica, Slayer e Social Distortion. Quando você decidiu misturar esses estilos todos? Foi um plano ou surgiu naturalmente? E por que esse estilo anos 1950 nas suas músicas?

Michael Poulsen – Primeiro de tudo, nunca foi um plano e nunca houve uma receita, sabe? Porque, se você colocar esses elementos no papel, parece uma coisa quase impossível de fazer, soa esquisito pra caramba.

Sempre teve a ver com o fato de eu vir da cena do metal. Mas pude notar que algumas das coisas que eu fazia quando comecei a compor estava mais nos anos 1950.

Desde aquela época e até hoje, eu realmente gostava do som do metal. Mas a composição é mais inspirada nas melodias dos anos 1950. E aí poderia ser algo mais tipo Elvis Presley, Jerry Lee Lewis, Chuck Berry, Little Richard e bandas como eles.

Então, quando comecei a compor, isso veio muito naturalmente: nós queríamos manter um som pesado, mas tinha de ter melodias dos anos 1950. Isso explica o meu vocal meio que lamurioso, nossas melodias, mas nós ainda temos peso. Esses estilos combinados deram no estilo do Volbeat.

G1 – Você já disse em entrevistas que não gosta de Facebook, Twitter e Instagram. Por quê?

Volbeat – Acho que é um assunto sobre o qual podemos discutir por muitas horas. Nesta época moderna, em 2018, fazemos as coisas de um jeito diferente do que costumávamos fazer. Sou daquela geração que cresceu sem internet, sem telefone celular, iPhones e coisas assim.

Lembrar daqueles dias em que nós tínhamos, na verdade, que pegar a bicicleta, o trem, o ônibus, para chegar a uma loja de discos, encontrar aquele disco que você tinha visto em uma revista que você tinha comprado ou lido na estação do trem… Era sempre um certo desafio conseguir o que você realmente queria.

Além disso, se você tivesse uma opinião sobre alguma coisa, você saía de casa e encontrava pessoas no bar ou em caças de show aonde você ia para ouvir bandas.

Hoje em dia, é como se tudo estivesse a um clique de distância na internet, sabe? Para mim, é como se o espírito ou a alma tivesse ido embora pela janela… Este é meu ponto: algo dessa mágica meio que se foi. Porque daqui a algumas horas a nova geração vai ter uma outra banda favorita ou uma outra coisa para fazer, porque sempre tem um “clique” novo adiante a cada segundo.

Pessoalmente, não acho que isso tenha charme ou seja inspirador. Não tenho Facebook, Instagram, Twitter, porque para mim é demais, e não me dá nada de volta. Ainda tenho minha vida privada e pessoal.

Estou ciente de que é uma ferramenta importante se você tem uma banda ou é um artista, é o jeito como você se promove hoje em dia, porque as mídias, como os jornais, eles mal conseguem sobreviver hoje em dia.

Sinto falta daqueles dias em que éramos desafiados: você tinha de comprar uma revista para descobrir os discos, tinha de ir às lojas e, uma vez lá dentro, tinha de achar o disco. Então a paixão e o mistério se perderam, se é que você me entende.

G1 – Acha que isso também influência no modo como as bandas escrevem suas músicas, a partir desses contatos em redes sociais?

Volbeat – Acredito é só um jeito de se promover. Lembro de, quando comecei, ia debaixo de chuva ou de neve colocando meus cartazes em todos os lugares na minha cidadezinha. E no outro dia fazia tudo de novo…

Não estou dizendo que tudo é ruim nas redes sociais, porque é claro que também tem oportunidades incríveis para se promover. É preciso aceitar isso, mas você precisa encontrar seu próprio equilíbrio ali.

G1 – Você também dizia que, com as redes sociais, acaba o mistério sobre certos artistas, e você gostaria de manter certo mistério com relação aos seus heróis. Quem são eles, tirando Elvis, Johnny Cash e Mike Ness?

Michael Poulsen – Eu sou um grande nerd do boxe. Acompanho muitos lutadores, viajo para vê-los lutar quando não estou em turnê, tem alguns que se tornaram meus amigos, aí me chamam para suas lutas.

Quando era jovem, tive de decidir se queria ser um boxeador ou se queria ser músico. Escolhi música porque, provavelmente, poderia ser mais fácil sair por aí, ficar bêbado, na estrada e ainda assim tocando música (risos). Agora, se você ficar bebendo durante os treinamentos, provavelmente não vai dar certo na hora da luta (risos).

G1 – Você aprendeu muito sobre a música dos anos 1950 com seus pais e os discos que eles tocavam em casa. No ano passado, você tornou-se pai. Que discos toca ou gostaria de tocar para sua filhinha?

Michael Poulsen – (Risos) Minha garotinha se chama Ea Abigail. Não quero forçá-la a ouvir nada, porque seus filhos vão sempre contra você (risos). Mas é claro que, quando ela ficar mais velha, vou fazer tudo que puder para lhe contar como me inspirei pelos anos 1950, de onde veio a música dos anos 1950, cornfield music, gospel, blues…

Vou dar uma aula de história, para ela não pensar que todo tipo de música foi criado no “X-Factor” ou na TV (risos). Mas vai caber a ela decidir do que vai gostar ou não.

G1 – Muita gente já não acha mais tão atraente tocar guitarra. E o rock não está bem nas paradas. O que pensa a respeito?

Michael Poulsen – Não sei… Não podemos negar que a música pop é o que está tocando no rádio, basicamente. Por mim, está ok – as coisas são como elas são. Mas o rock sempre vai ser o estilo de música que vai sobreviver para sempre. E não estou dizendo isso porque toco rock. É um fato que o rock ter uma vida longa, já que muitos artistas pop são facilmente esquecidos um ou dois anos depois de terem um hit. Aí um outro artista pop surge.

Mas muitas bandas, muitas bandas lendárias vão sobreviver para sempre – o nome delas e a música delas vão sobreviver. Não acho que você possa encontrar muitos artistas pop lendários que vão durar para sempre.

G1 – O Volbeat já fez turnê com o Metallica. Como foi isso? O Lars, baterista do Metallica, é dinamarquês também.

Michael Poulsen – Os caras do Metallica se tornaram nossos amigos mesmo. A primeira vez em que tocamos com o Metallica foi em 2007 ou 2008, aqui na Dinamarca. Eles estavam sem tocar aqui fazia muito tempo, então o Lars na época ficou ligando para as pessoas e perguntando: “Quem som bom está rolando na Dinamarca agora?”. Todo mundo falou do Volbeat.

E Lars foi nos ouvir e gostou. Tocamos naquele show na Dinamarca, foi muito bom. Depois, nos convidaram para a turnê nos Estados Unidos, na Europa, no ano passado teve uma turnê grande em estádios nos Estados Unidos de novo.

Ficamos muito próximos, hoje converso com James, Lars [do Metallica]. Sabe, mesmo que sejam nossos maiores ídolos – e eles são a maior banda de rock pesado do mundo –, são apenas seres humanos. São como todo mundo, apesar de rockstars. É muito fácil conviver com eles, são ótimas pessoas.

G1 – O Volbeat existe desde 2001. Você mudou muito de lá para cá?

Michael Poulsen – Bem, nós não fazemos mais tanta festa quanto fazíamos, não bebemos tanto quanto bebíamos.

G1 – Vocês pararam de beber?

Michael Poulsen – Nós ainda bebemos um pouquinho. Quando você começa uma banda, turnês, você toca em clubes, você tem tanta energia, tanto a provar, tudo é como uma única grande festa, você está sempre bêbado pra caramba, não consegue lembrar dos shows…

Tem muitos shows de que não lembro porque estava muito chapado (risos).

De repente, o Volbet ficou realmente grande, então estávamos viajando mais em turnês, saímos de nossos empregos convencionais. Então, do nada, não tem mais a ver só com diversão – aquilo tornou-se nosso trabalho. Muita gente compra ingressos – e há uma diferença enorme entre tocar para 30 pessoas em clubes pequenos e tocar para 50 mil pessoas em um estádio.

Precisamos ficar mais sérios. E não estou falando só por mim, mas por todos na banda. Não podíamos estar bêbados todos os dias, porque senão não teríamos condições de tocar ao vivo. Nós meio que passamos a pegar leve nas festas, para nos concentrarmos em ser uma banda de sucesso, porque amamos a banda, turnês, e nos importamos com os fãs que compram ingressos caros para os shows.

Mas o mais importante é que ainda estamos aqui, lançando discos, fazendo turnês, o Volbeat tornou-se um grande sucesso na Europa e nos Estados Unidos. Agora, vamos para a América do Sul para meio que começar tudo de novo. Não somos uma banda grande no Brasil, na Argentina – não somos nada, estamos apenas começando tudo de novo, tem um grande desafio aí.